Cetoacidose diabética
CAPÍTULO 8
DOI: 10.29327/5417839.1-8
AUTORES:
Ana Flávia Oliveira Diniz
Livia Carvalho Murta Botelho
Rafael Murad Magalhães Oliveira
Gabriel Henrique Leite Ribeiro
RESUMO:
A cetoacidose diabética (CAD) é uma emergência médica aguda que afeta principalmente pessoas com diabetes tipo 1, embora também possa ocorrer, em menor proporção, em pacientes com diabetes tipo 2. Pode manifestar-se tanto no momento do diagnóstico, sendo potencialmente mais agressiva, quanto em pacientes já diagnosticados que se descompensam devido a infecções, traumas, descontinuidade da medicação ou gravidez. A CAD tem maior incidência em crianças e adultos jovens, justamente por ser a população mais acometida pelo diabetes tipo 1. O mecanismo da CAD baseia-se na deficiência parcial ou absoluta de insulina, levando o corpo a liberar hormônios contra reguladores como glucagon e cortisol, com o objetivo de gerar energia para as células por meio da lipólise. Devido a esse processo de gliconeogênese, ocorre uma intensificação da lipólise e produção de ácidos graxos, culminando na liberação de corpos cetônicos na corrente sanguínea e, consequentemente, na cetoacidose.
Historicamente, a primeira descrição da CAD foi em 1886. Nesse período, a taxa de mortalidade era quase 100%. Foi só a partir de meados da década de 1920, com a introdução da insulina como forma de tratamento, que ocorreu uma importante redução no número de mortes, o qual caiu para entre 30% a 50%. A mortalidade permaneceu nesses valores até a década de 1950, quando Jacob Holler estabeleceu a influência da hipocalemia nas mortes, e iniciou-se um conjunto de terapias mais eficientes para a cetoacidose diabética, como a correção dos distúrbios eletrolíticos, a hidratação adequada do paciente e o uso de insulina regular. Atualmente, a taxa de mortalidade varia em torno de 5%, sendo mais elevada em pacientes idosos e com comorbidades de pior repercussão. Vale ressaltar que o desenvolvimento de edema cerebral eleva a mortalidade para 30%, devido à gravidade dessa evolução.
O diagnóstico inicia-se com uma rápida identificação clínica dos sinais e sintomas iniciais, que evoluem rapidamente, normalmente em até 24 horas. Esses sintomas incluem poliúria, polidipsia, náuseas, dor abdominal e histórico de perda de peso, podendo evoluir para um quadro mais grave com hiperpneia, sonolência e coma. Os parâmetros laboratoriais que confirmam o diagnóstico são hiperglicemia, acidose metabólica e cetose, que serão detalhados no capítulo de diagnóstico. A maior complicação, com maior potencial de morte, ainda é a evolução para edema cerebral. Dentro dos parâmetros de diagnóstico laboratoriais, há um destaque maior para os índices de pH, que classificam o grau de gravidade do quadro, dividindo-o em leve, moderado e grave. Após o diagnóstico, o paciente deve ser prontamente tratado com controle glicêmico, eletrolítico, hídrico e resolução dos fatores precipitantes. Atingido o estado de resolução da CAD, deve-se fazer uma transição da insulina intravenosa para a subcutânea.
Recentemente, a cetoacidose diabética euglicêmica (CAD-E), descrita inicialmente na década de 1970 e sendo caracterizada por cetoacidose com glicose sérica pouco elevada, passou a ser uma questão de maior discussão devido à sua relação com o uso dos inibidores do cotransportador de sódio-glicose-2 (SGLT2). Esse medicamento tem sido utilizado tanto para o tratamento do diabetes quanto de doenças cardíacas e renais. Apesar disso, em alguns pacientes – principalmente os já suscetíveis -, têm favorecido a desordem endócrina. Outra preocupação mais recente é a infecção por COVID-19 e seu impacto em pacientes com diabetes mellitus descontrolada ou já em quadro de CAD.